Se pudesse escolher uma profissão, eu seria cantora de ópera. Acho até que quase consegui algumas características. O
corpo de cantora de ópera, por exemplo, eu já tenho há algum tempo. Mas a voz está mais para Tetê Espindola
desafinada do que para Monserrat Caballe. Já me disseram que cantar se aprende, mas eu queria ter nascido com o
talento natural de uma cantora lírica. Aprender dá muito trabalho e eu tenho um talento natural para a preguiça.



Escrito pela Alê Félix
9, dezembro, 2002
Comentários desativados em Contralto com defeito
Compartilhe

Meus avós maternos eram muito pobrezinhos quando casaram. Rodaram o estado de São Paulo antes de se firmarem em um
local. Moraram na cidade de Americana (onde minha mãe nasceu), depois voltaram para a capital e continuaram a saga
entre Vila Ré, Artur Alvim, Guaianazes, Mauá, Santo André e, por último, Santo Amaro. Cada mudança, um filho; para
cada um, uma letra M de presente. Pobres como eram, a única alegria da minha avó no período de gestação era ficar
matutando para achar algum nome bonito que começasse com a mesma letra do nome da primeira filha. Assim ficariam
todos com algo em comum, além dos vínculos materno e paterno.
Mas as crianças que poeticamente foram batizadas de Maria, Marcos, Maurílio, Maurício, Marcia, Magda e Marilda
trataram logo de bagunçar o coreto para: Tatá, Maco, Lilo, Licinho, Marcinha, Guida e Liuda. Eles eram ótimos para
inventar nomes e apelidos.
Com a chegada da última filha veio também o terreno que ajudaria todos eles a se ergerem na vida. Depois de morarem
em casas de pau-a-pique, casas de parentes e de favor, eles conseguiram comprar um bom pedaço de terra onde a cidade
terminava.
Quando eu nasci, todos eles eram muito crianças, inclusive minha mãe, que me teve aos dezoito anos de idade.
Naquela época, pobre, de familia numerosa e primogênita, o destino não poderia ser outro. Casar era uma boa solução
para todos. Graças a Deus, mesmo com todos esses fatores, ela teve a sorte de casar por amor, paixão e porque
queria.
Meu pai morava em um bairro vizinho mas, depois de ter atropelado minha mãe com uma bicicleta, tratou de mudar o
percurso que fazia até o trabalho para que pudesse vê-la com mais frequência. Meu avô autorizou o namoro, construiu
um puxadinho no fundo do terreno, meus pais casaram e pouco menos de um ano depois do casório eu nasci.
Fui feita em época de carnaval, na cidade de Poços de Caldas, na lua de mel apertada que eles conseguiram ter. Nove
meses depois, minha mãe chegaria da maternidade e me apresentaria para todos os outros emes que dividiriam o terreno
conosco. Ela conta que eles cercaram meu berço e brigaram para me segurar em seus colos. Enquanto eles discutiam,
meu pai só queria saber se minha mãe já havia decidido pelo meu nome; ele precisava ir até o cartório me registrar.
Discussão levantada, todos os emes decidiram dar palpites e nomes esdrúxulos começaram a surgir de todos os lados:
ela tem rostinho de Minnie (idéia da tia que adorava a Minnie do Mickey). Não, ela vai se chamar Tiara (coisas da
minha tia perua que vivia de tiaras e adorava esse nome). Lucille Ball, coloque Lucille Ball (pré adolescente
tarado, aquele meu tio!). Meu pai interrompeu a bagunça dizendo que, por ele, seria Marília (cidade onde ele
nasceu). Todos os emes começaram a pular gritando: Mais um eme, mais um eme, mais um eme! Minha mãe, por sua vez,
exausta do parto e daquele monte de criancinhas que ela teria que continuar convivendo mesmo depois de casada, puxou
meu pai pelo colarinho e disse: Tudo, menos outro eme.
De lá para cá, meu pai costuma dizer que não se pode discutir com uma mulher que acabou de parir. Ele saiu de casa,
pegou os documentos, entrou na fila de registros do cartório e quando chegou a sua vez, perguntou para o escrivão:
– Por favor, será que o senhor não pode me dar uma dica. Eu preciso registrar a minha filha e estou com uma dúvida
danada. Que nome o pessoal da fila tem colocado em meninas?
– Ah seu moço, o nome que mais eu vejo chegar aqui é Alexandra, Alessandra, Aleksandra. Parece que todo mundo
decidiu botar esse nome nas filhas.
– Ah é? É um nome bonito… e não é um eme. Minha menina, bem que tem carinha de Alê. Pois, pode colocar esse aí
então.
– De que jeito o senhor prefere?
– Vê do jeito mais fácil de escrever. Assim ela não vai precisar soletrar muito na vida.
Eu poderia ter sido mais um eme se todos tivessem concordado com Marilia, mas acabei sendo mais uma das várias Alês,
vitimas da moda que era este nome na época. Bem, dos males o menor, antes vítima da moda do que assinar Tiara,
Minnie ou Lucille Ball.



Escrito pela Alê Félix
8, dezembro, 2002
Comentários desativados em O fim dos ees
Compartilhe

A febre da infidelidade masculina.
Vocês já viram um homem apaixonado? Ele mata e morre por sua causa e não olha nem para os lados. Mas paixão passa,
ele volta ao normal e continua olhando bundas alheias. Isto não significa que ele deixará de gostar de você, mas vai
morrer olhando as bundas que passam.
De verdade, não estou nem aí para este hábito involuntário da natureza masculina e acho que vocês também não
deveriam ligar. O problema não é quando ele olha, mas sim quando ele para de olhar. Quando isto acontecer, trate de
saber o motivo sutilmente e mude este quadro, antes que seja tarde demais.
Eu tive um namoradinho uma vez que, no começo da relação, deu um chega pra lá nos amigos dizendo que só queria ficar
comigo, que só tinha olhos para mim, blá, blá, blá. Eu, tonta que era, achei super bonitinho e deixei ele naquele
estado catatônico. Dois anos depois e ele não agüentava mais ficar sem olhar para os lados. Não foi fácil. Fuja
deste tipo de relação, como o diabo da cruz. Não vale a pena. Mas que fique claro que paciência tem limite. Se o
cara começar a exagerar e bancar o trouxa de fazer isso na sua frente, sinta-se à vontade para subir nas tamancas.
Mas vamos voltar à vaca fria: imagina se para todo lugar que ele olhar, a bunda olhar de volta? É onde eu acho que
nós, mulheres, erramos.
Vocês concordam que, se a maré estiver para peixe, será muito mais fácil ele pular a cerca? Não adianta dizer que os
homens são uns cachorros-cretinos-infiéis. É a famosa lei da oferta e da procura.
Se toda bunda que passa olhar de volta para o rapaz, o que tende a acontecer é que, primeiro, ele vai querer
conhecer todas as bundas que estiverem ao seu alcance; segundo, não vai mais olhar com tanto gosto depois da
centésima bunda que ele conheceu e vai passar a tratar todas com um certo descaso; terceiro, quando foi que as
mulheres pararam de fazer cara de difíceis? O que deu na cabeça oca de vocês para perderem o melhor da brincadeira?
Fato: está pipocando mulher por ai e uma grande parte está na fase do “vem em mim, que eu sou ‘facinha'”.
O que vocês esperam que esses rapazes façam? Se fosse o contrário, faríamos pior. Queria ver se estivesse chovendo
homens ao invés de estar sobrando mulheres nessa terra. Vai dizer pra mim que a mulherada se manteria fiel?
Dúvide-o-dó!
A coisa está bem feia. Melhor virar este jogo antes que a homossexualidade feminina deixe de ser uma opção para se
tornar uma necessidade.
Eu acredito que algumas mudanças de comportamento feminino já reverteriam, a médio prazo, este processo, mas
precisaria de algo que eu acho que mulheres não tem: união. De qualquer forma, vamos lá. Minhas possíveis soluções
para o problema:

  • Chega dessa palhaçada de “ficar”. Este tipo de relação exige um talento especial para administrá-la, que
    poucos possuem. Se você não tem, não “fique”. Daqui para frente, só pedindo em namoro ou deixando claro como é que
    vai ser. Já vi mulheres se contorcendo de dúvidas sobre o seu estado civil depois de seis meses saindo com o cara.
    Será que ninguém mais sabe falar sobre isso? Custa dizer se é namoro ou amizade?

  • Nada de beijar antes de dizer o seu nome, idade, estado civil, R.G., C.P.F. e C.E.P. Quem já comeu a sobremesa
    não vai querer ver o cardápio.

  • Caso seja inevitável e aconteça de você ficar com alguém, ignore coisas do tipo não ligar no dia seguinte e
    desaparecer do mapa. Se isso aconteceu é por que não era para ser e pronto. Chega de reclamar desse tipo de coisa.
    Se tem uma coisa que homem adora é praticar canalhices que estão na moda. Basta ver como eles são competitivos e
    maria-vai-com-as-outras. Por isso pare de fazer propaganda gratuita desse tipo de homem. Eles podem até dizer que
    não são assim na sua frente mas, em seus clubes do bola regados a cerveja, eles riem e admiram as atitudes cretinas
    de homens galinhas e insensíveis.

  • Se nada disso funcionar lembre-se sempre do que a minha sábia avó repetiu durante anos no meu ouvido: Homem é
    que nem biscoito, vai um e vem dezoito.

Post Anterior: Direitos iguais.
Próxima parada: Futilidades, neuroses femininas e suas consequências.



Escrito pela Alê Félix
7, dezembro, 2002
Comentários desativados em Sessão WC Unissex:
Compartilhe

Já vi muitas pessoas acharem que um anjinho e um diabinho cochicham em seus ouvidos. Sempre achei que esta era uma
forma romântica de expressar o turbilhão de coisas que acontecem dentro de nós, mesmo tendo conhecido as minhas
vozes interiores muito cedo.
Como nunca fui religiosa e questionava muito esse negócio de certo e errado, meus símbolos não se adequaram aos
ícones do bem e do mal. Uma das vozes ganhou o título de velha senhora e lembro dela ter ganho esse nome quando eu
ainda era bem pequenina.
Ela reinou soberana dentro de mim durante anos. Não era uma velha fácil, tinha os pés no chão, era severa em muitas
situações, exigia demais das pessoas, era rabugenta, séria e excessivamente independente. Não tolerava de forma
alguma que se metessem comigo, nem com a minha vida. É óbvio que, com esta senhora governando a minha existência e
berrando no meu ouvido, não tive uma infância nada tranqüila. Vira e mexe me metia em confusão. Meu pai reclama até
hoje que eu enfiei a mão na cara dele aos dois anos de idade. Eu não! A Velha. Mas vai explicar… Ela é a mulher da
razão, a briguenta, que não permite que eu carregue desaforos nem até o quintal de casa, a dona que enfia o dedo no
nariz das pessoas e fala mais alto sempre que lhe dá na cachola. É ela a responsável pela minha precocidade,
maturidade e responsabilidade. É culpada também pela minha memória de elefante, pela ausência temporária de
paciência que muitas vezes eu tenho, é fonte de inspiração para os meus dias de cara feia.
Ela me atormenta sempre que acha que deve. Penso em asilá-la desde o dia que a sorrateira tirou a máscara, mas
sempre que tento afastá-la de mim, ela joga o elefante pesadão da minha memória em cima da minha consciência (seu
departamento preferido) e faz com que eu reconheça a sua importância.
Ela já brigou muito para me defender, já botou pra correr muitos dos meus medos. E os que sobraram ela tratou de
isolá-los em um lugar seguro para que eu não os veja.
Durante anos ouvi somente a voz grave da velha senhora que residia na minha cabeça. Até que um dia uma outra voz
surgiu para contrariar as recomendações da Velha. Uma voz mais jovem e mais estridente soprou no meu ouvido um olá
misturado com um sorriso malandro. Foi por volta dos meus quatorze, quinze anos. Era um som sedutor, uma voz
adolescente, porém muito articulada, de um timbre que me dava adrenalina e coragem suficientes para ignorar um pouco
a Velha.
Foi aí que começaram os problemas. Justamente no período que a Velha estava mais atuante, chegou essa moça e desatou
a mudar a minha vida. A Velha ficou enfurecida durante um bom tempo e foram tantas as brigas internas que eu quase
expulsei as duas. Uma dizia “não”, a outra dizia “sim”; uma dizia “fique em casa”, a outra dizia “fuja pela janela”;
uma dizia “esse rapaz não” e a outra dizia “vai ser só mais um”; uma dizia “vá estudar”, a outra dizia “vá viver”.
Era um pesadelo. Mesmo respeitando as opiniões da Velha, era impossível dizer não para minha porra-louca de plantão.
Ela tanto me conquistou e fez mudanças tão importantes na minha vida e na minha personalidade que acabou
conquistando a Velha também.
Boa de papo, aquela menina! Mas malandra de tudo! Era uma maluquice atrás da outra. A Velha passou a intervir
somente em situações de perigo. Eu só ouvia a voz dela dizendo: “Se meteu em encrenca, agora sai.” Nestas horas,
tanto eu quanto a minha menina levada, olhávamos para ela com cara de socorro. Torcíamos para que tudo fosse um
sonho e que acabasse logo. Mas ela sorria ironicamente e dizia: “Vocês vão ver o estrago na hora que o despertador
tocar”.
Eu só não me preocupava mais porque a doida da novata tinha uma gargalhada e um brilho nos olhos que me contagiavam
e me faziam levar a vida muito pouco a sério. Sempre que eu oscilava, ela vinha com o mesmo argumento: “O que você
tem a perder? A vida é assim, o momento é esse. Na pior das hipóteses você vai rir disso no futuro.” Ela sempre
usava como seus aliados a efemeridade do tempo, a rigidez dos seres humanos com suas vidas medíocres, a grandeza do
universo, a alegria de viver a vida intensamente e, quando nada disso fazia efeito sobre mim, a danada ficava em um
canto sentada, cantando baixinho na minha cabeça: “vida, louca vida, vida breve, já que eu não posso te levar, quero
que você me leve”.
Era o seu golpe baixo para me fazer ceder e eu cedia. E adorava vê-la saltar dentro de mim e gritar de satisfação.
Até a Velha ria nestas horas, com desdém, mas ria.
Hoje em dia, elas se dão muito bem. Conversam com mais tolerância, discutem menos e até aprenderam muito uma com a
outra. Sinto que elas gostam tanto desta convivência que, muitas vezes, eu acho que elas pararam de atuar na minha
vida para observá-la. Penso até que elas cansaram de mim, que andam me deixando muito solta. Que bobas! Não fazem
idéia do quanto eu gosto da participação delas.
No fundo, no fundo elas sabem que são muito parecidas. Souberam se respeitar, identificar a hora certa de entrar em
ação e acabaram formando uma bela dupla. Ou por necessidade, ou porque no final das contas as duas perceberam que
tinham um objetivo em comum e que a prioridade era me ver feliz.



Escrito pela Alê Félix
5, dezembro, 2002
Comentários desativados em A Velha e Malandra
Compartilhe

Vou lá ver e já volto.
Inté.
_________________________>>>>
Duas e trinta e oito da manhã:
Voltei cansada e satisfeita. Desenterrei do meu baú de quinquilharias a minha primeira máquina fotográfica (ela
estava aposentada há anos, estávamos de mal). Sai do jogo com dois filmes de 800 ASA batidos e um registro visual
filho da mãe de bonito. Uns estão gravados no negativo, outros na minha memória. Depois eu conto. Enquanto isso, vou
torcer para não ter perdido a mão com equipamentos fotográficos. Acho que é primeira vez na vida que saio com essa
máquina para me divertir.
Engraçado… um blog pode manter você preso entre quatro paredes horas ou pode fazer você sentir necessidade de ir
ali fora viver um pouco, nem que seja só pra ter o que contar. É enlouquecedor, mas hoje, graças a este blog, senti
falta de ver gente.
E que bom que foi…



Escrito pela Alê Félix
4, dezembro, 2002
Comentários desativados em Será que ainda tem ingressos para o jogo do Corinthians?
Compartilhe

Será o marido da mulher do pires?
Sempre que baixa o espírito da Madre Tereza em mim, eu acabo indo contra os gritos da minha intuição. Fico achando
que o mundo é cor de rosa e quero sair perdoando e semeando a bondade. Eu sabia que a minha decisão de retomar as
drenagens linfáticas com a mulher do pires tinha acontecido depois da minha ida à terapeuta e isso me parecia
racional mas, mesmo assim, algo me dizia que tinha a ver com a presença do espirito bom que segurava meus lábios de
um canto ao outro naquele momento.
Com toda a naturalidade do mundo e como se nada tivesse acontecido, liguei para a mulher do pires para agendar uma
nova sessão.
– Ué! Não ia viajar?
– Eu menti para você Célia. Estava muito triste, não queria mais fazer as massagens, aquele não tinha sido um dia
bom e eu não soube como te dizer. Será que você pode me desculpar? Estou arrependida e agora que estou melhor achei
que te devia uma explicação. Eu agi de forma insensata com seu poodle e gostaria muito de continuar fazendo as
massagens contigo. Você é muito boa profissional.
É incrível a capacidade que as pessoas tem de matar um assunto sem discussão quando você admite um erro, uma
mentira, um defeito. Dona Célia ficou calada uma fração de segundo. Com a orelha colada no aparelho telefônico, ouvi
a mulher respirar fundo, balbuciar e dizer que eu poderia ir no horário combinado da primeira vez e no dia que eu
achasse conveniente, bastaria ligar com antecedência de uma hora.
Para alguém que tem a agenda lotada eu até estranhei, mas acabei confirmando para o dia seguinte.
Encostei o carro na frente do prédio procurando por uma vaga na rua. O porteiro do prédio saiu sorridente da guarita
e veio em direção a mim.
– Boa noite! Tudo bem com o senhor?
– Quanta alegria ver a senhora. Deixa que eu estaciono o carro, tem uma vaga sobrando na garagem, eu coloco ele lá
para você, quer dizer, para a senhora. É mais seguro.
Estranhei, muito…
– Ahn… Não tem problema? As vagas do prédio não são só para os moradores?
– Não, de forma alguma! Quer dizer, são. Mas a senhora aqui é uma exceção.
Pronto. Não entendi mais nada. Mas aceitei a gentileza diante de tantos dentes e brilho nos olhos. Se não fosse tão
surreal encontrar tamanha atenção na cidade de São Paulo, eu teria realmente me sentido importante.
A inusitada situação com o porteiro acabou fazendo com que eu subisse sem ser anunciada. Mas só me dei conta disso
quando estava no hall, de frente para a porta de entrada do apartamento da dona Célia. Antes que eu cogitasse a
possibilidade de dar meia volta e avisá-la pelo interfone, ouvi um estrondo de panelada em sua porta. Dei graças a
Deus de estar do lado de fora e já ia correndo para o elevador quando a porta se abriu e eu tive que fazer cara de
mulher invisível. Deve ter funcionado. Um senhor passou bufando por mim como se eu não existisse. Já a dona Célia,
não sei se de raiva ou de vergonha, tinha todo o sangue concentrado na cabeça. Sequer assimilou o descuido da
portaria, pediu que eu entrasse e virou-se como se eu fosse de casa.
Pulei a frigideira, peguei-a do chão e coloquei-a na mesa da cozinha. Não fiz cerimônias. Precisava evitar maiores
constrangimentos.
Dona Célia dirigiu-se ao banheiro e voltou de lá como se nada tivesse acontecido. Fiz o mesmo. Eu é que não ia tocar
no assunto. Tirei a roupa, coloquei em cima do sofá e lembrei que, por conta dos meus ascos mal resolvidos, dentro
da bolsa tinha um lençol e um creme que eu pretendia usar. Mas como é que eu ia contar para a mulher do pires que
tinha acabado de dar uma frigideirada no “marido”, que eu tinha levado meu lençol de algodão e meu próprio creme de
massagem? Diante daquele silêncio todo o meu discurso sobre alergia a não-tecido parecia não justificar que eu
abrisse a minha boca. –>Continua



Escrito pela Alê Félix
4, dezembro, 2002
Comentários desativados em A mulher do pires ( Post VI )
Compartilhe

Eu já contei que eu sou pagã? Tenho o maior orgulho de ser pagã. Minha família, tanto por parte de pai quanto de
mãe, é pagã há umas três gerações.
Para quem não entende nada de paganismo, isso significa que eu não fui batizada quando nenê, não tive educação
religiosa, só entrei em igrejas para assistir casamentos e missas de sétimo dia e não tive padrinho e madrinha. Não
significa que eu não acredite em deus ou coisas do tipo. Também não significa que eu acredite totalmente na
existência divina. Tem dias que eu acredito, tem dias que não. Digamos que eu acredito, mas não tenho certeza. É
mais ou menos assim que funciona. Costumo dizer que eu sou pagã, graças a deus.
Agora, tem coisas que eu não consigo compreender e nem discuto. Religião, por exemplo. Eu poderia até dizer que
respeito, se eu não julgasse como fraqueza de espírito. Religião, para mim, não passa do fã-clube de deus ou do nome
que acharem mais conveniente. Entendo que ter uma religião pode até ser bom, mas custa muito caro e não suporto a
sensação de estar sendo ludibriada.
Por conta dessas minhas crenças e pela minha fé no ser humano, sempre acreditei que a igreja católica (nada pessoal,
só por ser a número um) mais cedo ou mais tarde iria para o brejo. Nunca acreditei que as pessoas se deixariam
enganar por tanto tempo. E, para mim, este era um bom motivo para o fim do reinado dessas instituições.
Mas como deus escreve certo por linhas tortas, o óbvio não aconteceu. Parece que, ao que tudo indica, a começar pela
igreja católica, a ruína virá de dentro. A igreja católica está considerando a hipótese de pedir falência nos EUA, por conta dos supostos
processos por abuso sexual dos padrecos. Não os culpo. Mente vazia, moradia do diabo.
O problema é que, nos Estados Unidos, assim como existe abuso sexual, existe também abuso de indenizações legais por
direito. Qualquer cantada mal dada pode lhe custar a alma.
Não podia ser melhor! Se uma empresa falir, ela não terá mais como continuar no mercado. Mas, se igreja não é puro
comércio, quero ver elas abrirem as portas se não sobrar dinheiro em caixa. Para mim não haverá cristo que fará com
que elas continuem existindo.



Escrito pela Alê Félix
2, dezembro, 2002
Comentários desativados em "Você pode enganar algumas pessoas o tempo todo ou todas as pessoas durante algum tempo, mas você não pode
Compartilhe

O Marco, ex proprietário do Pirão sem Dono, decidiu
liberar o blog. No bom sentido crianças…
Ele convidou uma mulherada para tricotar por lá, enquanto ele fica nas praias da Cidade Maravilhosa tomando cerveja
e sol.
Nós, moças prestativas e muito queridas por ele, decidimos dar a maior força para que ele liberasse o blog em paz. :
) (Gostei da brincadeira besta!)
Com vocês, as Valkírias do Apocalipse: Carol, Eve, Thakira e Thya Vhannya e eu, né? Vou ter que meter pirão no meu
amarula com sucrilhos.



Escrito pela Alê Félix
2, dezembro, 2002
Comentários desativados em Quem quer Pirão?
Compartilhe