Quem pode entender uma mãe? Eu não entendo a minha. Nunca imaginei que ela pudesse participar daquela presepada toda. Entre cafés e perguntas, ela
driblou a saia justa e me defendeu com maestria. Quem diria que minha mãe era uma mentirosa de mão cheia!? Não uma mentirosa ruim; uma mentirosa boa.
Ela não gostou do que aconteceu, nada nada. Mas foi capaz de compreender que tudo não passou de um grande incidente e que a verdade, naquele momento,
poderia ser muito difícil de ser digerida.
Saí do quarto e fui ajudá-la, mesmo sabendo que ela queria me fuzilar.
Nenhum dos familiares do Cadu, nem mesmo ele, desconfiaram. Também não havia o que desconfiar, nem o que confessar.
O namoro acabou um ano depois. Passada a fase de turbulências pós fim de relacionamento, conseguimos manter a amizade que tínhamos antes e durante o
namoro. Ficamos com o que encontramos de melhor um no outro; o resto, tratamos de esquecer.
Um dia desses ele me ligou pra bater papo.
– Oi! Tá ocupada?
– Não. Pode falar. Tudo bem contigo?
– Tudo. Escuta isso…
Ele leu de cabo a rabo a carta de amor mais brega da face da terra. Bateu uma vontade louca de sacaneá-lo, mas achei que era mau tirar sarro da moça
que se deu ao trabalho de escrever aquelas ladainhas pra ele. Segurei as piadas e tratei de ser o menos cruel possível.
– Uhhh… quem é a apaixonada? Tá namorando, hein? Que beleza!
– Gostou? Você que escreveu!
Silêncio…
Fui incapaz de reconhecer a carta mas, no momento seguinte dele ter dito que eu a tinha escrito, lembrei até do dia. Maldita memória!
– Mentira!
– HAHAHHAHHAHAH! – Ele ria escancaradamente, ria de se contorcer. Não me contive.
Precisava dar o troco…
– Ah, é assim? %$#@*&^ Lembra aquele dia que você foi parar na casa dos meus pais de táxi, com toda a sua família, achando que eu estava no
hospital? Lembra? Do flash que eu vendi pra um garoto que não me pagou? Lembra?
– O que isso tem a ver Alessandra?
– Era primeiro de abril! Iurruuu! Bem feito! Se ferrou! Vem me sacanear com cartinha-de-amor-ridícula-do-passado, vem…
– Mentira…
– he he… Você nem imagina quanta…
Clique aqui para ler a história do começo



Escrito pela Alê Félix
3, abril, 2003
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Cheiro de naftalina
Hoje de manhã eu envelheci. E como eu estava enganada. Achei a vida toda que a velhice chegaria com a surpresa de um fio de cabelo branco, com a
impressão das primeiras rugas ou com o cansaço do corpo, mas não. Ela veio vestida de…
Para continuar, clique aqui.



Escrito pela Alê Félix
2, abril, 2003
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O zumzumzum de gente chegou na porta do meu quarto. Fingi que estava dormindo pra não dar bandeira, mas senti o Cadu sentando ao meu lado, passando a
mão nos meu cabelos e me dando uma chacoalhada. Eu bem que me fiz de morta, mas ele me deu outra sacudida. Virei de lado e dei uma resmungada. Ele
respirou fundo. Baixinho, como se estivesse falando para si próprio, ele disse :
– Que bom que você está viva.
Levantou da cama, saiu do quarto e pediu para que todos saíssem para que eu pudesse descansar.
Me senti um lixo, o maior lixo de todos. Partiu o coração espiar os olhos dele cheios de lágrimas e sentir sua aflição, querendo saber se eu estava
bem, se estava machucada.
Tive vontade de ir até ele, dizer tudo o que tinha acontecido, dizer que eu era uma imprestável e que ele fosse embora procurar alguém melhor do que
eu. Mas, contrariando os meus desejos e o que era correto, fui me certificar do papo que estava rolando na cozinha. Afinal, minha mãe podia estar,
naquele momento, dizendo tudo o que eu havia pensado mas não teria coragem para dizer.



Escrito pela Alê Félix
2, abril, 2003
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– Mãe, pelamordedeus! Você precisa ajudar a gente!
– Foi idéia da Alessandra!
– O que vocês aprontaram?
– Não olha pra mim, não! Pergunta pra Alessandra.
– Você sabe que hoje é primeiro de abril, né?
– Fala de uma vez antes que eu dê uma surra nas duas!
– Pára, mãe! Sem essa, eu não tenho mais idade pra apanhar. Foi só um acidente. Na verdade, só você pode nos salvar…
– Que acidente?
– Não, nenhum acidente. É que a Shirley ligou para o Cadu e…
– Liguei porque ela mandou, mãe!
– Quieta! Deixa a sua irmã explicar.
– Então… ela ligou de brincadeira. Disse que eu voltei na favela para recuperar meu flash, que houve um tiroteio, que uma ambulância me levou pra
um hospital e que você estava lá comigo. Só que o Cadu não esperou ela dizer que era primeiro de abril e largou a Shirley falando sozinha no
telefone. Aí a gente ligou pra vizinha dele e ela disse que eles estão vindo pra cá de táxi. Ele e toda a família.
– Eu não posso acreditar que vocês fizeram uma palhaçada dessas com a família do Cadu!
– Mãe, por favor! Se a gente disser que foi só um susto, que eu desmaiei no meio do tiroteio e que você foi me buscar no hospital, nada de mais vai
acontecer. Eles não precisam saber que foi tudo mentira. Eu vou morrer de vergonha…
– Que morra! Quem sabe assim você aprende. Não me peça para mentir e compactuar com esta situação ridícula que vocês duas tramaram. E esperem só o
pai de vocês chegar em casa!
– Mãe, eu não tive culpa. A Alessandra que inventou tudo!
– Você ajudou, a culpa é sua também. Não quero saber de discussão…
Durante meia hora, imploramos e choramos aos pés da minha mãe. Eu, pedindo que ela não me entregasse aos parentes do Cadu e minha irmã, pedindo que
ela não a entregasse ao meu pai. Até que a campainha tocou.
– São eles! Mãe, tenha dó de mim! Eu vou pra cama, você diz que eu tô descansando e a Shirley confirma tudo.
– Eu vou é cair na gargalhada.
– Shirley, se você der um risinho, um único risinho, eu juro que te soco quando eles forem embora.
Corri para debaixo das cobertas e esperei pelo pior. Se uma das duas desse pra trás eu estaria arruinada. Eu e o namoro…
Continua—->>>



Escrito pela Alê Félix
1, abril, 2003
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– Cadu? Oi, é a Shirley…
– Shirley? O que foi que aconteceu?
– Calma Cadu! Eu nem falei nada… você está bem?
– Aconteceu alguma coisa com a Alessandra? Ela foi atrás do flash, não foi?
Minha irmã prendia o nariz com os dedos pra não rir. Ele devia estar tão preocupado com o que tinha acontecido na noite anterior, que ela não
resistiu.
– Olha, eu acho que está tudo bem. É que eu estou sozinha em casa, minha mãe ligou e está com ela no hospital.
– Hospital?
– É… ela foi pegar o dinheiro de volta, teve um tiroteio na favela e levaram ela de ambulância para o hospi… Cadu? Cadu? Você está aí? Cacete,
não tem ninguém no telefone!
Peguei o telefone da mão dela. O telefone estava mudo, ninguém respondia. Desliguei.
– Como assim? O que ele disse? O que você falou?
– O que eu falei? Tá louca? Você ouviu o que eu falei! Será que ele desmaiou? É um tonto esse seu namorado, hein? Que cabeça de jerico!
– Ele é um amor, não fala mal dele! Mas… puta-que-o-pariu, Shirley! E agora?
Por um momento, ficamos as duas rindo desesperadas, sem saber o que fazer. Ligávamos para a casa dele e só dava ocupado. O telefone estaria fora do
gancho? Sem saber que atitude tomar, tivemos a brilhante idéia de ligar pra uma vizinha que pudesse nos ajudar. Graças ao serviço de auxílio à lista,
encontramos um nome conhecido. Minha irmã ligou.
– Alô. Por favor a dona Eulália?
– Ela mesma.
– Oi, é a Shirley que está falando, irmã da Alessandra.
– Ah! Shirley do céu! O que aconteceu com a sua irmã?
– Até a senhora já sabe?
A Shirley jogou a mão sobre a testa. Como ela não entendia meus sinais, comecei a sussurrar: – Pede pra ela avisar que o telefone está fora do
gancho. – Levei um pontapé.
– Então dona Eulália, eu estava falando com o Cadu e ele esqueceu o telefone fora do gancho…
– Ah, mas ele ficou tão aflito que saiu cego à procura de um táxi.
– Saiu? Táxi?
– O quê? O quê? – Grudei o ouvido no aparelho. Precisava ouvir o que a vizinha dizia.
– O carro dele está com o Papo (o pai). Ele saiu correndo atrás de um táxi e está indo pra sua casa.
– Ahnnnnn! Mas…e agora? Ele é louco?
– Não fala que é mentira. – Ajoelhei e implorei, grudada nas pernas da minha irmã. Ela deu um croque na minha cabeça e me empurrou com a perna.
– Dona Eulália, faz tempo que ele saiu?
– Nem cinco minutos. Foi todo mundo com ele! A Marisa (a mãe), a Daniela (a irmã), o Bênio (o irmão) e a Fifi (a poodle preta).
– Até a Fifi?
– Eles saíram com tanta pressa que levaram a cachorra junto. Olha, me dá noticias da Alessandra assim que ela voltar do hospital, viu?
– Claro… ligo sim. Um beijo pra senhora.
Ela desligou o telefone e ficou olhando pra minha cara.
– Lascou! E agora?
– Como é que aquele louco do seu namorado faz um negócio desses?
– Ai, chega! A gente precisa pensar em uma solução. Daqui no máximo a uma hora eles estarão aqui.
– A gente uma ova! Problema seu. Vou dizer que você me obrigou e não quero nem saber. Vire-se, cada um com seus problemas.
– Eu faço tudo que você quiser se você me ajudar a sair dessa.
– Meu! A hora que a mamãe chegar e souber essa história ela vai matar a gente!
– Puta-que-o-pariu! Esqueci da mamãe!
– O que é que tem a mamãe?
Parada na porta da sala com pose de açucareiro, o tom de voz da minha mãe prometia várias chineladas. Explicar o ocorrido não seria nada fácil.
Continua…



Escrito pela Alê Félix
1, abril, 2003
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31 de Março de 1991
Foi minha primeira grande aquisição com dinheiro próprio: um flash Metz C-41, alemão, com não sei o quê de ouro e o escambau. Não perdia uma foto com
ele. Também, por aquele preço! Paguei uma fortuna em suaves prestações. Para pagá-lo, precisei vender meu outro flash; um Mirage meia boca que só me
dava dor de cabeça.
Vendi pra um garoto do bairro que estava louco por ele, mas me deu um balão na hora de pagar. Fiquei tão nervosa que fui atrás do garoto; ou ele me
pagava ou me devolvia o flash.
Fui atrás mais ou menos… Quando descobri que ele morava em uma favela super boca-quente e que tinha vendido meu flash pra outra pessoa, enchi a
paciência do meu namorado pra ir comigo. Na época, eu tinha um namorado gracinha de tudo, desses que mata e morre pela namorada. Ele era todo
desesperado, mas vivia me protegendo. Eu tanto falei e tanto insisti que ele foi comigo procurar o menino.
Não o encontramos. Demos com a cara na porta depois de ter atravessado uma favela barra pesadíssima. Saímos de lá rezando para chegar em casa. Quando
chegamos, ele me fez jurar que eu não voltaria naquele lugar sozinha. Eu jurei e deixei-o ir embora, porque já era tarde e ele morava do outro lado
da cidade.
No dia seguinte acordei entediada. Café na mesa, minha mãe não estava, os pivetinhos dos meus irmãos estavam na escola e a chata da minha irmã tinha
acabado de conquistar o direito de usar o aparelho de som só pra ela. Teria sido um dia sofrível, se não fosse primeiro de abril.
– Ô, preciso falar com você.
Silêncio. Eu e minha irmã nos odiávamos.
– Fala comigo, menina!
– O que você quer?
– Ficar de bem. O que você acha da gente fazer as pazes pra sempre? É sério. Prometo que não te azucrino mais e você promete não fofocar sobre a
minha vida nem para o papai, nem para a mamãe. O que você acha?
– Eu não sou fofoqueira!
Silêncio…
– Tô falando pra valer. Quero ser sua amiga.
– Para de mentir menina!
– Depois não diz que eu não tentei. Estou oferecendo minha amizade.
– Fala logo o que é você quer! Aposto que está metida em alguma encrenca e precisa da minha ajuda.
– Tá bom. Não acredita em mim, problema seu.
Silêncio…
– Tá bom, tá bom, mas se você pisar na bola comigo eu juro que…
– PRIMEIRO DE ABRILLLLLL!!!!
– OTÁRIA! %^&$#@
Arremesso de talheres…
Passada a raiva, saí do banheiro (eu me trancava no banheiro para provocá-la sem sofrer agressões físicas) e fui falar com ela.
– Trégua, trégua, trégua…
– Sai daqui! Não quero falar com você. Desinfeta do meu quarto antes que eu te dê uma sapatada na cabeça!
– Calma, ô! Descontrolada-passa-mal.
Silêncio…
– Tenho uma proposta de paz.
– Não fala comigo!
– E se a gente pegasse o Cadu no primeiro de abril?
– Não conta comigo.
– Vai, deixa de ser chata! Já tenho tudo em mente.
– N-Ã-O!
– Você liga na casa dele, diz que eu voltei na favela hoje de manhã pra recuperar o meu flash, diz que rolou um tiroteio e que você não sabe direito
o que aconteceu, mas que eu fui levada de ambulância para o hospital.
Silêncio…
– Beleza! Fala ai o telefone dele.
A história continua nos posts aí em cima…



Escrito pela Alê Félix
1, abril, 2003
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Ok, eu admito. Eu sou uma besta. Adoro primeiro de abril; vou fazer o quê? Deve ser a dose que me resta de infantilidade. Não tentem tirá-la de mim,
porque não sobrou muita coisa.
O bom é que tenho várias histórias “boas” desta data. Pra variar, maridon cai todo ano… uma judiação. Eu sei que eu perdi os escrúpulos e ando
fazendo brincadeiras muito pesadas há alguns anos. Mas pensam que é fácil achar repertório pra pegar todo mundo, todo ano? Vocês não fazem idéia da
quantidade de pessoas que eu engravidei, a quantidade de carros que foram roubados, os namoros terminados… Chegou um dia que nada mais fazia
efeito e decidi apelar para as tragédias inquestionáveis. Foi o caos. Levei um susto tão grande que passei dois anos seguidos sem brincar de primeiro
de abril. Vou escrever e conto daqui a pouco.



Escrito pela Alê Félix
1, abril, 2003
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Tem gente que mente o ano todo. Eu só minto nos primeiros de abril, minto contra mim e vocês ainda vão brigar comigo? Tá bom vó, eu não brinco mais
de morrer…@#$%^^&&*%^%%%%%###@



Escrito pela Alê Félix
1, abril, 2003
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