Marilu era uma das garotas mais faladas do colégio. Enquanto o charme do momento era pedir um tempo pra pensar antes de namorar, Marilu ignorava
a etiqueta e “ficava”. Para garotas como ela, aqueles foram anos injustos. Bastaram duas tardes de beijos na boca (uma tarde com um, outra tarde com
outro), para que sua fama de galinha desavergonhada espalhasse como o cheiro do sopão oferecido às terças-feiras. Cheiro horrível, aquele! Só
morrendo de fome pra comer aquela gororoba. E era assim mesmo que se referiam à Marilu. “Dia de canjão! Cozinharam a Marilu!”.
A danada era linda. E, como se não bastasse ser bonita, tinha um humor e uma desenvoltura social invejáveis. Seu primeiro dia de aula gerou um grande
bochicho entre os rapazes e fez torcer o nariz da maior parte das meninas. Em menos de um mês já tinha ficado com pelo menos meia dúzia dos garotos
da lista dos “Top 10 Vespertino”, recebeu duas advertências da diretoria por cabular aulas e deixou muita gente com medo da sua língua ferina e do
seu soco certeiro. Deu uma surra de dar dó em uma engomadinha metida a besta que não parava de falar dela pelos corredores e deixou claro com todas
as letras e com um português muito bem resolvido, que sentaria a mão em qualquer um que lhe ofendesse. E eles continuaram ofendendo mas baixo e
longe, bem longe da palma de sua mão.
Por essas e outras, nunca me aproximei muito dela, mesmo nossas carteiras sendo tão próximas. O maldito medo do julgamento alheio me fazia ficar
quietinha no meu canto. Achava, covardemente, que falar com ela me transformaria na Dona Galinha número dois. Mas, mesmo sem proximidade alguma, suas
atitudes faziam com que eu torcesse a seu favor. Num universo onde todos queriam ser aceitos e a moda era ser igual ao outro pra não ser motivo de
chacota, ela ignorava as leis e circulava com o dedo em riste. As meninas a odiavam, os garotos a desejavam e, tanto eles quanto elas, falavam mais
do que deviam e a conheciam menos do que gostariam.
De saco cheio do falatório e com a cabeça estourando de preocupação com a proximidade do dia que eu teria que dar a resposta para o Murilo, decidi me
afastar um pouco das rodinhas e das panelinhas de sempre.
O primeiro sinal tocou e logo as filas se formaram para que cantássemos o Hino Nacional. Todo santo dia a mesma coisa. Vivenciávamos o fim de um
longo período de ditadura no Brasil, mas muitas escolas públicas ainda tinham essa rotina: hino nacional, fila pra entrar, filas e mais filas em
silêncio absoluto, aulas hipócritas de educação moral e cívica e um centro cívico, formado por um bando de alunos babacas, que incentivavam aquela
patacoada toda. Eu odiava aquilo tudo. Não tinha condições de compreender o que acontecia no Brasil e muito menos porque éramos obrigados a engolir
imposições como aquelas, mas eu era muito nova pra sacar o mundo à minha volta, principalmente quando minha maior preocupação tornou-se aprender a
beijar. E, de tão preocupada com este detalhe, esqueci de cantarolar o raio do hino. Até que levei um cutucão da Marilu:
– A Esther vem vindo, fica esperta!
– Tá louca?

Entretida com meus pensamentos, levei um susto e acabei falando mais alto do que devia. Alto suficiente pra inspetora cruela, que já estava de olho
em mim, achar que eu e a Marilu estávamos com descaso a bandeira. Fomos as duas para a diretoria.
———-> Continua
Clique aqui para ler o Post I – A saga do primeiro beijo.



Escrito pela Alê Félix
16, julho, 2003
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– Alê, você teria coragem de fazer um pacto com o diabo?
– Eu não!
– Mas você não é pagã, atéia, sem fé…?
– Sou.
– Se não acredita em Deus o que você tem a perder?
– Não acredito agora que eu estou viva, depois que eu morrer é bom que ele exista.



Escrito pela Alê Félix
13, julho, 2003
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CLube da Lulu



Escrito pela Alê Félix
12, julho, 2003
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Há muitos anos eu trabalho em casa e, até muito pouco tempo, isto me incomodava bastante. Achava que pessoas, como eu, que trabalhavam fora de um
escritório cheio de lantejoulas podiam parecer amadoras, menos capazes… entre outras crenças que a pressão das aparências e dos velhos conceitos
sobre bons empregos ainda geram nas nossas cabeças. Levei muito tempo para relaxar e perceber que eu adoro trabalhar em casa e que tudo que eu faço
brincando, eu faço melhor. Desde então, não admito que me peçam para fazer diferente.
Adoro acordar e passar o dia de pijama no meu escritoriozinho doméstico. Atender o telefone sem fio esticada no sofá nos dias de bode, bater papo com
os amigos pelo ICQ entre a resolução de um ou outro problema, ler os livros que nos enviam tomando sol na varanda e poder mandar tudo à merda no meio
do dia sem ter que dar explicações ou agüentar caras feias. Adoro falar de trabalho só com hora marcada ou por telefone, o muro da minha casa me
preserva dos desgastes diários de relacionamento. Adoro não ter horários, não receber ordens e não ter que dá-las.
Num mundo imbecil, onde a maior parte das pessoas, ricas ou pobres, só pensa em dinheiro e fama, me sinto cada dia mais feliz com a minha vidinha
simples, barata e livre. O dia de amanhã eu não sei, mas hoje ela me satisfaz e é isto que importa. Conheço poucos pensamentos mais castradores do
que aqueles que levam à aposentadoria.
Mesmo em paz com meus ofícios, sinto que algumas coisas ainda precisam ser resolvidas. O conforto de ter um escritório a alguns segundos da minha
cama é uma dádiva em muitos momentos, mas às vezes me causa alguns aborrecimentos porque acabo trabalhando e confiando mais do que deveria.
Um dia desses, dando uma entrevista pelo telefone, a jornalista questionou o possível crescimento da editora. Eu respondi que não quero que ela
cresça, não do jeito que estamos acostumados a ver empresas crescerem. Eu já dizia isto para os amigos e familiares, mas quando disse a ela, tive
certeza de que era realmente o que eu queria. É que esta é uma questão que se torna um paradoxo quando se nasce pobre. Quando nascemos pobres
acreditamos que o trabalho serve pra gente subir na vida, por isto precisei de alguns anos pra compreender que não queria subir pra porra de lugar
algum. Meu trabalho não é a minha vida, só preciso que ele alimente-a. E quando digo isto, quero dizer que ele não passa da ferramenta que eu escolhi
pra não depender de caridade.
Há pouquíssimo tempo eu era obcecada por trabalho, mas não voltarei a ser. Acho deprimente viver pra trabalhar, transformar o trabalho no que há de
mais importante. É, no mínimo, muito pouco criativo, seja ele qual for.
Não quero funcionários, não quero uma carga tributária mais complexa e menos justa do que a que eu sou obrigada a pagar, não quero trabalhar com
pessoas que eu não gosto e não confio, não quero ser patrão, não quero ser empregado, não quero sacanear pessoas para conquistar meus objetivos, não
quero fazer balancetes no final do mês, não quero pagar propina, não quero participar das máfias, das tribos, nem da massa.
Gosto de saber que minha única funcionária fixa é uma pessoa que fica puta comigo se eu passo mais de uma semana com a cara amarrada e que penso na
vida dela como se fosse a minha, porque sei que, bem ou mal, ela depende de mim e eu dependo dela. Gosto de saber que muitos dos meus amigos
participam dos projetos profissionais que eu me enfio e que muitos dos que não são amigos podem se tornar. Definitivamente não trabalho com gente
cretina, não pago mais micos do que o extremamente necessário e não trabalho mais do que vivo. Isso nunca fez bem pra minha alma, nem para o meu
humor.
Preciso de diversão e prazer, tanto ou mais do que de dinheiro, para sobreviver. E isto não é um luxo; é uma escolha. Uma dura escolha que exige
atenção constante e trabalho dobrado, mas outro tipo de trabalho. O trabalho de pensar diariamente sobre o que você quer e o que não quer para sua
vida, o trabalho de dar bananas ao invés de distrair-se correndo atrás de cenouras.



Escrito pela Alê Félix
11, julho, 2003
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Não me importo com a estrada que escolhi porque me sinto à vontade para virar à direita, à esquerda ou fazer retornos, quantos retornos eu
quiser, porque tanto faz olhar para trás, para frente ou para os lados, o azul do céu estará sempre escapando pelos vãos dos meus dedos, mas sempre
nas minhas mãos.
Quem rabisca o meu destino sou eu e os riscos do meu caminho não se parecem com uma linha reta, porque eu vivo embriagada da vida. Mas que diacho de
pensamento é esse? Que linha? Que caminho? Que estrada, se eu mal sinto meus pés no chão?
estrada.jpg



Escrito pela Alê Félix
10, julho, 2003
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Uma coisa é não ir com a cara do bichano outra coisa é maltratá-lo. Controlem-se e deixem de se exaltar antes que alguém denuncie este blog ao Ibama.
Logo eu, que espanto pernilongos assoprando-os porque tenho dó de espantá-los no tabefe. Eu só não gosto de gatinhos pendurados no meu pescoço,
desfiando minhas roupas ou me lambendo. Tenho uma boa lista de seres e coisas que eu não gosto, mas nada tanto e por tanto tempo assim. Pensando bem
eles são até interessantes, desde que eu cá, eles lá.



Escrito pela Alê Félix
10, julho, 2003
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Eu odeio mudanças! Não as da vida, as da vida são bem-vindas porque quando elas são boas me fazem rir à toa e, quando são ruins, me fazem rir
depois de algum tempo. Agora, mudança de provedor… que porca miséria! Eu não aguento mais tantas migrações virtuais. Decidi que quero ficar
milionária, de uma vez por todas, só pra chamar um homem da Granero que carregue todos os meus arquivos de um lado para o outro enquanto eu tomo sol
em uma ilha qualquer do Caribe.
E olha que eu reclamo de barriga cheia! Recebi ajuda de todos os lados: A Lia, minha
protegida e agora sócia, me fez um template. O Jaime meu amigo, ex-sócio e novo sócio em um novo projeto, instalou o Movable Type, fez a migração, me suportou e me deu suporte.
O Marco, nosso querido Marco de cada dia nos dai hoje, cedeu generosamente a base do
seu template. (A senha e o login do JMC estão sendo negociados por e-mail. Mandem
suas ofertas!). O Lambreta, meu futuro parceiro de tirinhas e cartunista da casa, desenhou
meu elefantinho de estimação que ficou no servidor do blogger, mas que deverá vir pra cá no futuro.
E o maridon… ai, ai o maridon. Maridon apagou o gato do Botero, meteu uma canga na gordutcha, aumentou a parede, fez botões, arrumou meus
comentários, aprendeu a mexer no movable type só pra me ajudar, aguentou meu humor instável, me deu aulas de física e matemática enquanto eu tentava
mexer no photoshop e ainda arranjava tempo pra dizer que os peitos da gordinha do Botero não faziam jus aos meus… (Palavras do maridon. Longe de
mim, fazer propaganda enganosa no meu próprio blog.)
Às vezes eu acho que não mereço os amigos e o maridon que eu tenho. Porque, mesmo depois de tanta ajuda, eu ainda tenho coragem de dizer que preciso
do homem da granero, caribenhos, dinheiro…

granero1.jpg
Me disseram que nínguém por aqui se lembraria do velho comercial da Granero. Aquele do “manhêêê, o homem da Granero chegou!”. Claro que lembram…
Mas será possível que só pirralhos visitam este blog? 🙂



Escrito pela Alê Félix
8, julho, 2003
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Aissiquiu
Valdirene queria vingança, nada além da mais pura e saborosa vingança.
– Não é possível que aquele cachorro-cretino-canalha passasse tantas horas grudado no micro atrás de mulheres sem que eu percebesse! Um sem
vergonha! Um mau-caráter! Como pôde me enganar durante todos estes anos? “Estou trabalhando, estou trabalhando, estou trabalhando… ”
Mentiroso-cara-de-pau! Dinheiro que é bom, nada! Mas eu juro, Clotilde… Ele pagará com sangue a humilhação que estou vivendo!
Diante do espelho do banheiro do shopping, sua expressão era a de uma demônia pronta para tirar a vida do marido traidor. A amiga, preocupada, botava
panos quentes:
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Escrito pela Alê Félix
5, julho, 2003
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