– Uma festa, oras bolas! Uma festa para comemorar o dia dos namorados.
– E quem aqui namora, eu posso saber?
– Acorda, Voadora! É por isso mesmo que vai se chamar festa dos incompetentes no amor. Uma festa para celebrarmos a liberdade, a amizade, a galinhagem e toda a nossa incompetência para namoros estáveis.
– Duvido que o seu Manuel libere o Fofão…
– Não agoura, Alê. Não agoura…
– Cara, ele tem que liberar! A festa já tem nome, mulheres… Só falta bebida e um lugar.
– Já vi tudo… Festa no Fofão era o que faltava.
– Que festa? Posso saber o que estão a tramar agora?

Seu Manuel nos pegou de surpresa e não estava para brincadeira. Também, não era pra menos. Seria pedir demais que, depois da presepada da delegacia, ele ainda fosse liberar as chaves da sucata de dois andares que ele mantinha escondida nos fundos da padaria. Ninguém sabia direito como diabos aquela imitação de ônibus inglês tinha ido parar lá. Zarolho contava a história de uma aposta entre o seu Manuel e o prefeito Jânio Quadros. Dizia que, graças a uma feliz coincidência e depois de um grande porre, o prefeito foi salvo pelo português de uma tremenda saia justa. Agradecido, ele o presenteou com seu maior sonho de consumo. Seu Manuel negava a história. Esbravejava dizendo que o ônibus era uma réplica montada a duras penas e que ele nunca na vida conhecera pessoalmente o prefeito. A construção da réplica seria uma boa desculpa se não fosse o fato de que ele escondia o Fofão como se fosse um cadáver no armário. Da noite para o dia o trombolho de dois andares apareceu no terreno que fazia fundos com a padaria, da noite para o dia os muros do campinho onde brincávamos foram levantados e transformados em uma garagem secreta. Seu Manuel bem que tentou escondê-lo de nós, mas com o Zarolho trabalhando pra ele e sendo nosso amigo, foi impossível. Depois de alguma resistência, o português acabou mostrando a relíquia pra nós, mas, por um bom tempo, fez um por um jurar segredo. O que nos fazia crer que, naquele mato, realmente havia coelho.

– Contem de uma vez! Que caras de palermas, são essas?
– Fala de uma vez, Zarolho…
– Sabe o que é, seu Manuel? A gente estava aqui pensando e… E sabe como é, né? Tem umas meninas novas por aí… E a gente estava pensando em uma festa…
– Não senhores. Não essa noite. Eu não sou pai de vocês por isto não vou aplicar nem sermão, nem chineladas que era o que todos precisavam. Mas, hoje, do bairro ninguém sai. Se quiserem ficar conversando no terreno atrás da padaria, tudo bem porque assim eu fico de olho em vocês. Caso contrário, esqueçam.
– Mas Seu Manuel… Ops, OK.

Às vezes não era necessário nenhum esforço pra convencer o seu Manuel…

– E sem “mas”. Vocês acham que são muito espertos, mas a mim vocês não enganam. Vocês deram muita sorte do delegado não prender o Oliveira por vandalismo, bestice, agressão e idiotice!

Seu Manuel devia ser a única pessoa do planeta que chamava o Zarolho por um dos seus nomes. Talvez porque “Oliveira”, fosse também um dos sobrenomes do português, talvez porque era o jeito dele de dizer que o considerava como se fosse um filho, talvez…

– Também não precisa humilhar, seu Manuel.
– Preciso sim! Você não é mais criança, rapaz! É um homem e tem que agir como tal. E vou dizer mais uma coisa: vocês podem ter escapado, mas não estão livres de serem punidos. Quero os cinco, às seis da manhã no refeitório do albergue. Estamos com mais quatro indigentes hospedados e a cozinheira terá que faltar amanhã.
– Seis da manhã! Pra fazer o quê?
– Criar vergonha nessas caras! Principalmente você, Alessandra. Depois do que você fez pela Maria deveria dar o exemplo e não estar em uma delegacia uma hora dessas.
– …
– E não me faça essa cara. Não foi culpa sua o que aconteceu com ela.

Que alivio… Era a primeira vez que ele falava comigo depois do sumiço da Maria dos Pacotes. Mesmo sabendo secretamente que ela nunca mais voltaria a vê-lo e me sentindo culpada por isso, o perdão dele já me confortava.

– Eu não tenho como ir não, seu Manuel. Amanhã tem muito pãozinho pra fazer porque é domingo e…
– E o senhor estará no albergue para preparar o café da manhã. Aqueles pobres são mais importantes do que o povo do bairro.
– Eu vou independente do horário. Pode contar comigo.
– Fala isso, porque você não dorme, Alê! Pó, eu tô acabadão. Foi um dia terrível… Puxado.
– Não quero conversa. Se estiverem cansados tratem de ir para casa e durmam. Não queriam ir a uma festa? Se estiverem dispostos para uma festa, precisam estar dispostos para o trabalho. Principalmente para o trabalho voluntário.
– Sermão…
– Vão, vão logo se divertir. Amanhã quero todos ajudando no albergue. E ai de vocês se atrasarem. O pai e a mãe de cada um vai saber o que aconteceu essa noite.
– Pai e mãe é sacanagem, português!
– A escolha é de vocês.
– A gente pode usar o aparelho de som do Fofão?
– Podem, mas já sabem: quero o ônibus encerado no dia seguinte.
– Uhu!
– A propósito…

O português abriu a porta do carro, abaixou-se até o porta-luvas e…

– Que diabos é isso, Oliveira?

Olhamos para a cara do Zarolho esperando uma resposta que explicasse o porquê daquele ovo preto que estava nas mãos do seu Manuel…

– Eu achei isto daqui lá nos fundos da padaria. O senhor pode me dizer do que se trata?
– Que desgraceira é essa, Zarolho?
– Desde quando galinha deu pra botar ovo crioulinho?
– Afe! Um ovo preto.
– É pintado!

Zarolho riu meio sem graça…

– É o ovo negro… Tá preto de canetinha preta… Mas eu juro que nunca fiz isso antes, seu Manuel! E não adianta vocês me olharem com essas caras de quem viu uma aberração! Podem dizer o que quiserem. Nos anos anteriores, no dia dos namorados, eu não saia pra tacar ovo em ninguém. Eu ia ao cinema, caramba! Eu juro!

– Então que ovo é esse Zarolho?
– É que na semana passada, no Dancing, eu pedi a Aninha em namoro…
– Aninha, a virgem?
– Dobra sua língua pra falar da Aninha, Voadora!
– Ei, relaxa! Vai ficar puto por quê? Ela está namorando o Ramon, seu filhote de cruz credo. Briga com ele e não comigo.
– Eu sei, eu sei… Foi por isso que eu deixei este ovo no sol. Pra ele ficar bem fedido e estalar na cabeça daquele banana antes que eles saíssem pra comemorar o dia dos namorados.
– Anh??
– Ah… Por isso que você marcou o danado com canetinha… Pra não misturar com os outros ovos. Entendi… Esse era o premiado… Meu querido, você é um gênio!
– Gênio uma ova, dona Marilu! Não quero vocês aprovando traquinagem um do outro. Você não tinha nada que fazer isso com o Ramon e com a Aninha, Oliveira! E eu já estou cansado dessas suas crises de rebeldia. Desse ano não passa a mudança do seu nome! Já falei com o advogado, mas ou você toma jeito ou não conte mais comigo nessa sua vida, rapaz!

Zarolho, o Um Dois Três de Oliveira Quatro, arregalou os olhos. Todos nós arregalamos os olhos… Enfim, o Zarolho mudaria o que mais lhe incomodava, o próprio nome.

– O senhor está falando sério?

Sim, ele estava. E, mesmo bravo com tudo o que havia acontecido naquela noite, ele sacudiu a cabeça afirmativamente, sorriu um meio sorriso com o canto dos lábios e tascou um peteleco na cabeça do Zarolho enquanto se abraçavam… Um abraço, um peteleco e uma ovada curtida no sol.

– Pô, seu Manuel! Logo com o ovo negro… Merda, meu cabelo vai feder durante um mês.
– Credo! Fedor…
– Melou seu esquema com as meninas do vôlei, hein Zarolho?
– Peraê, se o Zarolho não vai mais se chamar Um Dois Três de Oliveira Quatro, vai se chamar como?
– Vai se chamar Zarolho, ué!
– Deixa de ser ridículo, Ivo! Deixa o cara falar o nome…
– Eu conto pra vocês depois. Tem um nome que eu sempre quis ter. Vou pra casa tomar banho e vocês vão arrumando as coisas pra festa. Fui.
——————————–Continua.
Para ler o Post I, clique aqui.



Postado por:Alê Félix
13/09/2005
13 Comentários
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Tulio

setembro 13th, 2005 às 20:02

Pô! Um dois tres de oliveira quatro mudou de nome??? PQ????


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Paty

setembro 13th, 2005 às 20:04

Aeeeeeeeeeee! Cumprindo a promessa de escrever todas as historias!!! Amei!


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katia

setembro 13th, 2005 às 22:42

sugestões para o novo nome de um dois tres de oliveira quatro????inscrições abertas???? huahuhauahua…fiquei mais curiosa do que no princípio da história…beijo gde


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Juliana

setembro 14th, 2005 às 11:17

Adoro essa história!! É a melhor de todas as que vc escreve. Super beijo, Alê!


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Menina-Prodígio

setembro 14th, 2005 às 14:11

Tá ficando com gostinho de final…Solucionado o Ovo Negro, descoberto um ônibus de dois andares da época que o Jânio Quadros era PREFEITO, descoberto o destino de Um Dois Três de Oliveira quatro.
Quero ver essa festa, ai ai.


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Isabela

setembro 14th, 2005 às 14:52

Ale… brigada pelo scrap no orkut!!
Mas enfim… entrei aqui achando q vc teria cumprido a promessa de em uma semana atualizar todas as “séries”… eu sou doiiida pra saber o final da saga do primeiro beijo!!!!
Bjus!!!!


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Adri

setembro 14th, 2005 às 19:58

Caraca até o janio quadros entrou na história! hehehehe


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Gustavo

setembro 14th, 2005 às 20:01

Aqueles onibus de dois andares eram muito legais. Pega que tiraram de circulação. Eu pegava direto o praça da sé. Sério que o cara tinha um escondido no quintal? Muito boa essa história.


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nielphine

setembro 17th, 2005 às 3:05

pq não tem mais onibus d dois andares?


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aline

outubro 6th, 2005 às 17:02

oi mana


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girls

novembro 7th, 2005 às 6:00

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Marcelo

março 22nd, 2006 às 19:17

hauhaua nomes engraçados? “Rolando Escada Abaixo”
Juro q existe


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Cássia Zanotto

janeiro 6th, 2012 às 0:00

Ta ai uma parada que eu queria ler ate o final.. pena que vc desistiu Ale!!
Eu e minha irmã lemos todos os posts do ovo negro freneticamente!
Então, fica aqui registrado o pedido de leitoras antigas para a saga virar um livro on-line!! =D hehehe (ou algo do tipo).
Abraço!


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