Eu estranhei quando vi uma figura meio redonda e branca se aproximando do carro. Não foi possível
identificar se era homem ou mulher, mas não acreditei que fosse o Locutor.
A pessoa, a qual eu ainda não havia identificado o sexo, caminhou até a guarita do prédio e me fez rezar quando
o porteiro apontou na minha direção.
Não podia ser. Inconscientemente, me fiz de rogada e apertei o botão que fechava o vidro. Pensei em ir embora,
mas ele bateu no vidro do carro e me deixou sem muitas opções. Meio atordoada, meio indignada e sem acreditar no
que estava acontecendo, tentei ser simpática para não causar traumas na criança. Abri todos os vidros, a porta e
deixei que ele entrasse.
Não resisti. Antes mesmo de cumprimentá-lo eu perguntei:
– Garoto, quantos anos você tem?
Ele parecia preocupado e transpirava muito. Parecia que estava fugindo da polícia.
– Dezoito.
– Mentira! Nunca que você tem dezoito anos! Deixa eu ver seu RG.
Eu e minha mania de ver RG.
– Eu juro!
– Fala a verdade!
– Está bem, está bem… Eu tenho quatorze.
– Eu não acredito…
– Eu não disse antes porque achei que você ficaria brava, e eu gosto de você, e achei que você não falaria
comigo se soubesse a minha idade, e….
– Não é possível… Menino, como é que você entra no videotexto dizendo que é maior de idade, que trabalha como
locutor de rádio, diz uma porção de mentiras?
– Mas é o meu sonho…
– Então diz que é sonho criatura! E onde já se viu mentir a idade? Isso é perigoso sabia?
Por alguns instantes eu fiquei meio abobada. Não sabia se me esbofeteava ou se botava o moleque pra correr dali.
– Olha, não fica brava… eu não posso ficar aqui por muito tempo porque a minha mãe não gosta que eu converse
com mulheres mais velhas e eu não quero que ela te veja, porque senão…
– Como assim mulheres mais velhas?
– É que você não é a primeira mulher mais velha que eu conheço.
– O que? Menino, você é louco!
O meu viking era um garoto gordinho, em fase de crescimento e afetado pela desproporção física que os
homens sofrem na adolescência. A voz, hora grossa, hora desafinada nas horas de desespero, o fazia quase
gaguejar. Não era uma questão de corresponder ou não à imagem que eu havia feito; o que me incomodava era o fato
de ter sido ingênua e carente a ponto de não ter percebido antes. Por mais desenvoltura que o garoto tivesse
para escrever ou falar no telefone, desde o começo eu tive indícios do que se tratava. Não vi porque não quis e
porque aquela era uma forma de fugir das decisões que eu precisava tomar. Me senti uma imbecil e só queria sumir
daquela cena.
– Desculpa não ter contado, só não queria que você deixasse de gostar de mim.
– Você mentiu pra mim! E com essa voz… Como eu podia imaginar que você era uma criança?
– Eu não sou criança!
– Olha, eu não vou discutir com você. Vai embora por favor…
– Tudo bem, eu vou. Mas quero que você aceite o meu presente.
E ele tira uma estrela ninja do bolso.
– Foi o meu avô que me deu… Eu tinha cinco anos e ele morreu dois dias depois. Guardei ela comigo esses anos
todos e agora quero que ela fique com você para que te dê sorte…
– Eu não quero! Desculpa se parece grosseria, mas você guarda isso e dá de presente para alguém que mereça.
Aliás, não dá pra ninguém! Guarda de novo. É um presente do seu avô. Não é coisa pra sair dando. Além do mais,
onde é que eu vou enfiar uma…
Antes que eu terminasse a frase fui interrompida por uma ruiva tamanho família que, enfurecida por seus
instintos maternais, avançou nos meus cabelos gritando que eu era uma velha tarada querendo corromper o filho
dela. Ela não parava de gritar que o moleque só tinha treze anos de idade e que estava cansada da velharada que
se aproximava do garoto. Foi então que eu entendi melhor o que aquele menino fazia dia e noite no videotexto.
Mas da minha boca só saia um número e uma interrogação: “Treze? Treze? Treze?”, como se isso fizesse diferença.
Um tremendo banzé! O garoto, dando com a estrela ninja na mão da mãe para que ela me soltasse e eu tentando me
livrar das garras da progenitora.
Fui salva graças à serenidade e sabedoria da Sueli. Munida do seu Continental sem filtro, ela viu o zelador do
prédio com uma mangueira de água lavando a calçada, pediu emprestado e disparou o jato d’água contra a mãe do
locutor mirim.
Mesmo sem nunca ter olhado diferente para o jardim da infância, voltei para casa me sentindo, o que seria hoje,
a versão feminina do Michael Jackson e, depois de ter chorado duas noites seguidas, jurei que nunca mais
acreditaria em vozes e apelidos sexys. No meio da crise e chorando ao som de Lionel Richie, liguei para a casa
do clone e combinamos de nos encontrar. Eu precisava acabar com aquele noivado.

———————>> Continua.
Clique aqui para ler o Post I – O
começo de toda a história do videotexto



Postado por:Alê Félix
17/12/2003
0 Comentários
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Julia

dezembro 17th, 2003 às 13:58

Será que a saga também aparece essa semana?


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Airton

dezembro 17th, 2003 às 14:00

Seu gosto musical é o que mais me surpreende. Perla, Luis Miguel, Lionel Richie… he he he he! Ninguém é mesmo
perfeito.


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Trinity

dezembro 17th, 2003 às 14:03

Por essas e outras que eu só acredito vendo se na net existe gente que presta. Beincadeira, brincadeira… mas
essa de arranjar pretendentes às cegas é ruim, hein?


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Keka

dezembro 17th, 2003 às 15:48

Haha, nossa, me rachei de dar risada! Que cômico! Hehe, ai ai. Adorei (ao contrário de você), nem parece que é
real, parece que você criou! 😛 Mas sei que é real! Beijinhos, adoro suas histórias!


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Jorge

dezembro 17th, 2003 às 17:29

O seu blog é ótimo… me sinto até meio idiota de escrever o óbvio, seu blog é uma lenda, mas é ótimo…
Estou lendo a estória ou história do videotexto e adorando.
Se quiser falar sério:www.auroraconclusa.blogger.com.br
zueira no URL acima.


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Nati

dezembro 17th, 2003 às 21:55

Nossa este site é muito engraçado e diferente mesmo ..parabens adorei


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[Lucca D]

dezembro 17th, 2003 às 22:25

uia…
o blog do Botero 🙂
abraços


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monstrinha

dezembro 18th, 2003 às 7:41

ola!
encontrei seu link no Pequi. Cara! esse blog aqui é muito bom!
Me diverti muito lendo a estoria do video texto e com certeza vou voltar aqui para conferi as continuações.
parabéns pelo seu ótimo blog e pela sua ótima forma de escrever.
beijos


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Lala

dezembro 18th, 2003 às 8:50

Descobri, Alê.
Na foto vc está com cara de sono, e ñ de raiva…
Beijos.


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Nickita

dezembro 18th, 2003 às 9:21

Caramba!!!
Já tava com saudades dessas histórias!!!
Me diverti muito agora…
bjos


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Priscila

dezembro 18th, 2003 às 11:12

Oi achei um link pro seu blog no queima jesus, muito legal o seu, dei risada com as histórias. passa la no meu


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Sueli

dezembro 18th, 2003 às 11:27

Seu blog é muito bom !
Entrei por acaso e adorei mesmo.
Se interessar, visite o meu http://www.lpl.blogger.com.br (Fêmea de Rinoceronte)


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Taly

dezembro 18th, 2003 às 12:25

Argh!!!
Caramba…
Que situação grotesca gente!!!
hauahuahuh
Eu tive uma mais ou menos parecida..
eu achando que o garoto era beeem mais velho.. e não era. mas ele tb aparentava..
e eu não tinha conhecido por internet.. nada disso.. foi engraçado..
hehehehehe
beijinhos


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Lígia

dezembro 18th, 2003 às 13:07

Alê…
Post bem engraçado hein??? Acho que eu estava precisando de umas risadas msm…
Valeu pela conversa!!! ;o)
Te adoro…


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Mário Aragão

dezembro 18th, 2003 às 14:23

Muito bom o post, cai na gargalhada, o chefe descobriu que eu não estava trabalhando….
Melhor que a encomenda.
Linkada!
Aquele abraço.


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aline

dezembro 18th, 2003 às 17:39

Muito engraçado Ale, mas bem que você poderia colocar um post da saga.


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ratapulgo

dezembro 20th, 2003 às 10:46

Alê, querida,
Copy & Paste novamente
obrigadão e um ho ho ho


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mah

dezembro 20th, 2003 às 13:02

meu eu to amando suas historias vc escreve bem pra kct!!!
parabens!!!
bjuss


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Luis

dezembro 20th, 2003 às 13:45

eu tenho uma estrela ninja!!


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Patricia

dezembro 20th, 2003 às 17:49

mto super…..
Mas e a saga????


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Amanda

dezembro 27th, 2003 às 10:43

Oi Alessandra, adorei o seu blog. Tenho acompanhado todos os posts do videotexto e estou adorando. Aliás, estou
ansiosa p/ver a continuação. Kd? Beijãozão.


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