Eu não conheci o Hugo gago que certamente mordia sofás, mas conheci o Hugo Muffin. Mesmo assim, assim como seus pais, aprendi a admirá-lo pela
genialidade. Minhas lembranças do cabeludão são de fotografias que me fizeram rir do desleixo rebelde e nada mais do que isso. Acho até que o moço
que um dia quis mudar o mundo misturou-se com o cara que catava mulheres nos pontos de ônibus. Eu te conheci em uma época de caldeirão, onde era
difícil reconhecer uma ou outra fase. Uma época de caldeirão pra você, pra mim e para muitos daqueles que passaram pela cozinha do Tombaqui.
Durante muito tempo eu confesso que não tive olhos pra você. Você era só mais um dos nerds do videotexto, só mais um cara de óculos impressionado com
a vida de balcão e farra da Vila Madalena. Mas, aos poucos, fui me surpreendendo e rindo das suas histórias colecionadas nas esquinas e das suas
noites mal dormidas em cima do freezer, embaixo do piano e na cama de desconhecidos.
Aquele ano e o seguinte passaram rápido e foram muito difíceis para mim. Talvez os mais difíceis que já atravessei. Lembro que no primeiro ano da
M’Boi era pelos meus antigos amigos que eu esperava, quando você e o Jaime batiam na nossa porta depois de cruzarem a cidade só para dividirem
conosco o nosso caos, a Baré-Cola e o pão sovado. Você não imagina como era difícil compreender o que vocês faziam por lá, não imagina quantas noites
daquelas eu e o Rubens nos perguntamos o que é que vocês haviam visto na gente pra não sairem daquele fim de mundo e talvez não imagine o quanto
vocês dois foram vitais pra nossa saúde mental. Vocês foram os amigos novos, os amigos que não eram do Rubens e não eram meus. Sabe quando foi que eu
enxerguei isso? Não sei se você vai lembrar, mas foi um dia que você me chamou pra conversar longe do Rubens e do Jaime. Fui crente de que era
fofoca, toda sorridente e , de repente, você começou a me contar sobre alguns problemas pessoais que estava enfrentando… Claro que, na hora, eu
achei que fosse sacanagem, mas no momento seguinte percebi que nós quatro estávamos construindo uma grande relação. Éramos quatro rebeldes em busca
de sustento, éramos amigos de bar, amigos para rir, chorar e eu não havia me dado conta.
Sinto saudades sim. Sinto saudades do amigo 24 horas, do único cara que eu podia ligar as quatro da manhã para tomar café e falar da vida em um
boteco qualquer, do cara que se metia nas badalas mais surreais e nos divertia com sua vida sem lenço e sem documento. Sinto saudade do diariamente.
Um dia eu perguntei para o Rubens porque é que ele não saía mais vezes com o Marcão e com o Tó já que eles eram tão amigos. Ele me disse que não era
preciso. Que eles sabiam que podiam contar um com o outro sempre. A amizade não esfriava por falta de convívio. Naquela época eu era muito nova pra
compreender como uma amizade se sustentava sozinha, mas hoje eu sei. A sorte me deu algumas para que eu pudesse compreendê-las. E é assim que eu
sinto que somos. Eu, você, o Jaime e o Rubens. Não interessa quantas vezes vamos nascer e morrer dentro de nós, fazemos parte da história um do outro de um
jeito muito especial e por maiores que sejam as mudanças e as distâncias. Amigos assim, sempre terão uma estação de trem para poderem esbofetear a
cara de alguns passageiros.

Adorei ontem. Amo vocês três… Que puta papo de bêbado. Ainda bem que o Jaime não bebe e o Rubens não tem blog.



Postado por:Alê Félix
02/08/2003
0 Comentários
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Norma Lucia

agosto 2nd, 2003 às 20:20

Tenho muitas amizades assim…Auto-sustentáveis e especiais. Lógico que sinto falta do convívio que faz as coisas serem sempre o máximo, mas não
deixo de comemorar os anos que se passam sem que nada mude. Lindo o seu texto.


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iel

agosto 2nd, 2003 às 22:11

eu sempre vizito esse blog e tudo mais,mas nunca comentei…passei aqui pra comentar ,te parabenizar pq seu blog é massa e te convidar p/ vizitar o
meu …quando vc tiver um tempinhu


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Nostra

agosto 2nd, 2003 às 22:28

As amizades de verdade nuuuunca esfriam…
Os amigos podem estar distantes, mas não há distância que consiga acabar com uma verdadeira amizade!!!
Pabo de bebadu nada! Hic! bode valá avontade que zuzubem.. to na escuta! hic!
Sobriooooo!!!!!
Bjs!
Nostra


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Mi

agosto 2nd, 2003 às 22:33

Frequento os dois blogs e gosto muito dos dois… Nossa, a net pode ser mais real do que desconfia nossa vã filosofia… Antes de ler o seu eu estava
lendo o blog dele. Alê, vc tem algum livro??? Gosto muito do seu jeito de escrever.
Beijocas!


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o Equilibrista

agosto 3rd, 2003 às 0:19

Alê.
Chorei muito ao ler esse texto, não hoje, mas uns 2 anos antes de você escreve-lo.
Beijo, obrigado, te amo.


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Giggio

agosto 4th, 2003 às 19:07

Essas demonstracoes de afeto publicas sao muito bonitas. Sejam por email, blog, ao vivo, como for…
Que homem de sorte esse Hugo por ter amigos assim!


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Ju

agosto 4th, 2003 às 20:51

Putzzzzzzzz … chorei quinem criança quando li esse post …
Me lembrei que tenho alguns amigos assim e que às vezes a correria do dia-a-dia vai nos afastando sem a gente pereber.
Sabe o que vou fazer agora??? Ligar pra eles!
Beijo procê Alê.
Você continua ótima! 🙂


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Adler Sharon

março 18th, 2004 às 3:02

Every decent man is ashamed of the government he lives under.


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