Poucas pessoas que passam por aqui conhecem o P.A.. E quem o conhece sabe que sempre que se fala dele ou se fala com
ele é melhor sentar, respirar fundo e esperar, porque lá vem história. Vou contar pra vocês quem é este cara.
Eu conheci o P.A. em Junho de 1987. Foi em um congresso da UNE ou da UMES, não lembro mais. Foi a primeira vez na
vida que eu viajei sozinha, foi quando eu me apaixonei por política e foi um dos momentos que mais me trouxe pessoas
e histórias pra contar. O congresso aconteceria na cidade de Bauru e estudantes de toda a capital paulista se
reuniram na Estação da Luz para irmos de trem até a cidade. Lembro até hoje, com uma certa emoção, da estação tomada
por estudantes cantando a música “Será” do Legião Urbana. Era uma multidão boa de olhar, um frio na barriga bom de
sentir e eu não me recordo de ter batalhado tanto por algo, como fiz para convencer os meus pais a permitirem que eu
fosse àquele congresso. Fiz de tudo. Expliquei, persuadi, discursei, manipulei, menti, só não me permiti chorar e
espernear; afinal de contas eu não tinha mais idade para essas coisas.
Eles cederam com a condição de que me acompanhariam até a hora do embarque para se certificarem sobre os fins da
viagem e com que tipo de gente eu viajaria. É claro que eu pagaria o maior mico da face da Terra! Imagina! Eu seria
a única bobinha com papai e mamãe à tiracolo, mas era o preço. Me submeti às ordens dos donos da minha existência e
tratei de ser o mais discreta possível ao lado deles. Quanto menos gente me visse, menor o número de comentários
sobre a “protegidinha da mamãe” – os meios justificariam os fins.
Chegamos na estação e, não satisfeitos em me darem uma carona, eles quiseram conversar com os responsáveis pelo
congresso. Queriam saber com quem eles poderiam brigar caso tudo desse errado, coisas de pais. Como se houvessem
pessoas disponíveis para me proteger, como se eu não soubesse me proteger sozinha! Mal sabiam eles que ali era cada
um por si e deus a favor de todos. Mas eles quiseram se certificar de que eu estaria em boas mãos e eu tratei rápido
de pensar em alguém com cinco anos a mais do que eu, que estivesse afinado na retórica e que sacasse rápido que eu
precisava de uma defesa. Fui atrás de um dos organizadores e o apresentei para família. Começaram com as perguntas
básicas: kit de sobrevivência, possibilidades de más companhias e se havia divisão de meninas e meninos na hora de
dormir. Não adiantou eu dizer que o meu saco de dormir era individual. Vergonha das vergonhas, mas fazia parte do
processo “te amamos e nos preocupamos com você”.
O interrogatório ia de vento em popa até que surgiu no campo de visão da minha querida mãe quatro rapazes
entusiasmados carregando tantos garrafões de vinho que não era possível identificar seus rostos. Foi o fim! A cara
dos manés não dava pra ver, mas seus gritos de “Oba! Vamos encher a cara!” ecoavam até a Catedral da Sé.
Minha mãe me agarrou pelo braço.
– Vinho pra quê? Com esses bêbados você não vai a lugar algum!
Quis morrer de catapora preta! Fuzilei o organizador com meu olhar de “me salve agora e faça esses meninos
desaparecerem”, mas não adiantou muita coisa. Por um momento, até ele parecia não entender o que significava aquilo.
Foi quando um dos entusiasmados por trás dos galões de vinho surgiu e caminhou em nossa direção com um sorriso que
eu temi ser fruto de teor alcóolico. Ele chegou, se apresentou e eu joguei as mãos para o alto da cabeça. Eu tinha
completa convicção de que minha ida estava arruinada, até que o senhor simpatia, depois das apresentações, começou a
falar.
Sem que ninguém mencionasse a preocupação dos meus pais e o que estava em jogo naquele momento, ele imediatamente
explicou que o vinho seria usado pela organização do congresso, que venderia vinho quente na festa junina que
aconteceria na faculdade que hospedaria os estudantes. Explicou que o vinho havia sido comprado em uma adega, em
quantidade suficiente para aumentar as possibilidades de lucro e que meus pais não precisariam se preocupar com a
idéia de que aquele vinho seria consumido pelos estudantes, pois isso não seria permitido. Falou também sobre
estadia, responsabilidade e deu a palavra dele de que nada de ruim me aconteceria. A convicção usada pelo rapaz era
tão grande que até hoje eu acredito que o vinho teria tido o destino alegado por ele, mas minha mãe não acreditou e
queria me levar de volta para casa de qualquer jeito.
Perdidas as esperanças, pensei em chorar e espernear, me jogaria no chão se fosse preciso, cruzaria aquela estação
arrastada pela minha mãe implorando que ela me deixasse ir mas, antes que eu destruísse a minha reputação e
dignidade, os garrafões de vinho rolaram escadaria abaixo. Quinhentas pessoas olhando a cena boquiabertas, o vinho
se esvaindo pelos trilhos da plataforma do trem, as músicas cantaroladas e o som dos violões pararam para ouvir o
estilhaçar do vidro das garrafas. Foi quando o senhor simpatia fechou a boca, se recompôs do prejuízo, virou para os
meus pais e disse:
– Agora vocês não precisam mais se preocupar. – Houve um instante de silêncio, todos se olharam, meus pais se
entreolharam, curvaram-se até a minha altura, me abraçaram e disseram:
– Agora você pode ir.
Até hoje fico me perguntando o que falou mais forte naquela noite, se o santo dos meus pais que não queriam que eu
me metesse em encrencas, se o meu que queria desesperadamente passar por aquela experiência, ou o santo P.A que
falou tudo na hora certa e do jeito certo.
Foi assim que eu conheci o P.A, um amigo querido que o destino trouxe em horas que eu muito precisei. Mas por que
é que eu tô contando essa história? Ah! Deve ser porque hoje é o aniversário dele eu quero ver todo mundo na festa
das perucas, ou vai ver que é porque eu não sei fazer convites sem contar os meus causos. 😉

Maiores detalhes sobre a Festa da Peruca no blog
da Sol
, velha companheira de movimento estudantil e grande companheira da vida do P.A



Postado por:Alê Félix
24/01/2003
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